Cândido de Voltaire
Em "Cândido ou o otimismo", a ironia de Voltaire é divertida. Ao acompanhar os infortúnios de Cândido, Pangloss e Cunegundes e a leitura que esses personagens fazem de suas tragédias, vemos o quanto Voltaire dá alfinetadas na tradição aristotélica, na escolástica, no clero (jesuítas em especial), na ideia do "melhor dos mundos possível" de Leibniz tão amavelmente personalizado no otimismo de Pangloss e de Cândido.
Nunca me vi como um otimista. Aliás, não gosto muito dessa palavra. Sempre vi isso de ser otimista como algo meio infantil, desconectado da realidade. Claro que estou errado. Porém, sempre preferi a palavra esperança. Operar na realidade com esperança, olhando ao redor, mas também olhando para o que ainda não está presente e que, com a esperança, se quer cultivar.
Talvez, o sonhador, inconformado com a realidade, queira concretizar a esperança quando ainda não já lugar para ela no mundo.
Mas voltando ao Cândido, Voltaire questiona qualquer explicação totalizante que conforte ou forneça um sentido metafísico, sobrenatural para a existência. O faz com leveza e graça sem panfletar ódio. Dado que a dureza e os infortúnios da vida recaem sobre todos, desvalidos e nobres, no final da obra, a conclusão de Voltaire é bem pragmática:
"Deveis possuir - disse Cândido ao turco - vastas e magníficas terras.
Apenas vinte jeiras - respondeu o turco -; cultivo-as com meus filhos; o trabalho afasta de nós três grandes males: o tédio, o vício e a necessidade" (Cândido, XXX).
Esse encontro foi transformador. Cândido não se rebelou contra seu amado mestre Pangloss, que até o último parágrafo do livro procurou demonstrar que tudo o que aconteceu a Cândido desencadeou no melhor dos mundos possível.
Sua resposta a Pangloss:
"Muito bem - disse Cândido -, mas é preciso cultivar o nosso jardim".
Nesse trágico momento em que estamos vivendo, em que o absurdo do dia seguinte é mais estarrecedor que o anterior, qual é o teu jardim? Cultivemos com esperança.
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